JOSÉ BIÃO NETO
NOTA
DO EDITOR PARTE 1
POR: Prof. MSc. José Vicente Dalmolin
A última entrevista
dada por José Bião Neto, meses antes do seu falecimento ("in memoriam").
VIDA
E MORTE DE BIÃO, HISTORIADOR ANÔNIMO
Por Revista Executivo
Plus, a Revista de Mato Grosso do sul Ano 2 - nº 21
– Pags. 5-7 – jan/fev
1986.
“José Bião Neto, 72
anos, casou-se aos 65 anos, desquitou-se depois de 6 meses. Professor. Um
Cidadão comum aos olhos dos sul-matogrossenses. Pobre, morando numa casinha de
madeira cercada de flores bem cuidadas, na cidade de Guia Lopes da Laguna, onde
fez toda a sua história e escreveu uma das partes mais importantes da história
do Brasil, ocorrida no então Mato Grosso, hoje Mato Grosso do sul.
Um dos compromissos da
Revista Executivo tem sido com a História. Além dos prestimosos historiadores
da Academia Sul-matogrossense de Letras, buscamos em cada recanto deste Estado,
figuras importantes e anônimas de ilibada reputação que guardam na sua memória
fatos importantes que se passaram em
épocas remotas, pessoas que são ou fizeram parte da história.
No final de Setembro de
1985, encontramos em Guia Lopes, o Sr. Bião, que nos fez um belíssimo
depoimento. Infelizmente soubemos que ao meio dia de domingo de 10 de novembro
(1985), o Sr. Bião foi acometido de um mal súbito e não pode ver as narrativas que fez para a
Revista Executivo. Pela sua maneira simples e cativante, deixou-nos uma saudade
imensa, ele não pode ver publicada a sua narrativa, que ficará imorredoura.
Como militar, chegou em
Aquidauana, para servir no IV Batalhão de Sapadores (para quem ainda não sabe,
Sapadores era uma unidade militar encarregada de tudo aquilo relacionado com
movimento de terra, por exemplo, trincheiras, poços de água, pontes, etc.) Isso
foi em 1935, mas dois anos depois Bião Neto foi transferido para a 1ª Companhia
do Batalhão de Sapadores, situada no então chamado Acampamento do Rio Miranda,
hoje, progressiva Guia Lopes da Laguna, o cenário perfeito para Bião fazer
História, uma história contada num diário que cuidou como algo mais valioso da
sua vida.
O
Começo de tudo
Um ano depois da sua
chegada no Acampamento do Rio Miranda, começa o seu diário, e aqui nesta
entrevista exclusiva à Revista “Executivo Plus”, ele começa a contar o
surgimento de sua cidade adotada por ele como sua terra natal, pois Bião nasceu
em Garanhuns, Pernambuco:
__ Eu servia ao
Exército, nesta Companhia, quando nasceu uma criança no Acampamento. Foi a
Primeira, um motivo muito especial, portanto. O bebê era filho de José Antônio
Bulhões e Sebastiana Farias Bulhões. Ele era Sargento da 1ª Companhia de
Sapadores e morava aqui no Acampamento do Rio Miranda. Então surgiu a
dificuldade para batizar essa criança porque não tínhamos igreja, padre; apenas
três ranchos de taquara batida, cobertas com folhas de bacuri, uma palmeira
nativa da região.
__ o Padre – continuou
Bião, só vinha até Nioaque distante 54 km daqui, de 30 em 30 dias, e isso
quando não chovia, a criança trouxe ao mundo o nome de Newton Bulhões[1],
logo o pai do garoto, quer dizer Sargento José Antônio conseguiu um padrinho,
um outro Sargento muito seu amigo, o Peri José da Silva[2],
mas faltava ainda uma igreja, uma escola para crianças, enfim a criação de um
povoado. Entrou na história toda, o comandante da companhia, o Capitão
Teodorico de Farias, que deu todo o apoio para a criação do Povoado, inclusive
arranjando um topógrafo, o Jacó, conhecido como “Nego Jacó”.
__ Com topografo, o
Capitão foi fazendo contatos; juntou os fazendeiros da região. Entre eles estavam na época, o único filho
vivo do Histórico Guia Lopes da Laguna, que aliás tinha o mesmo nome do pai,
quer dizer José Francisco Lopes. Aliás, devo esclarecer que já li em algumas
publicações o nome de José Francisco
Lopes Filho, isso não é verdade, o fundador de Guia Lopes não tinha no nome o
Filho, era unicamente como o nome do pai dele, isto é, José Francisco Lopes.
Nascimento
da cidade
__
José Francisco Lopes, então doou as terras, uns 30 hectares. Outros fazendeiros
deram vacas, ajudaram a arrecadar dinheiro para fazer a igreja, e assim por
diante. No dia 12 de fevereiro de 1938, foi fundado o patrimônio de Guia Lopes
da Laguna e no dia 19 de março deste mesmo ano foi aprovada pelos fundadores,
pelo Capitão Teodorico de Farias e todos os moradores locais e da redondeza, a
ata de fundação de Guia Lopes da Laguna. Neste dia Newton foi batizado e
tivemos uma grande festa.
__ Escolhemos também o
padroeiro da cidade, que é são José, em homenagem aos nomes dos três fundadores
e a um herói que também chamava-se José, quer dizer José Francisco Lopes, (o
herói da Retirada da Laguna, o Guia Lopes); José Francisco Lopes, filho do Guia
Lopes e doador das terras e José Antônio Bulhões. Tem mais fundadores é claro,
mas os legítimos mesmo são José Antônio Bulhões, Peri José da Silva e José
Francisco Lopes.
__ Colocamos o nome da
Escola de “Visconde de Taunay”, o primeiro Tenente, correspondente oficial de
guerra, que escreveu o livro Retirada da Laguna. Juntando assim escola e igreja
formamos a maior atração para o povoamento de Guia Lopes. Quem queria casar
vinha para cá, e da mesma forma os fazendeiros interessados em dar instrução
aos seus filhos. Assim foi ajuntando gente, surgiu a primeira loja, a segunda,
e hoje está esta cidade maravilhosa que
é Guia Lopes da Laguna, que eu vi nascer.
Um
Amigo Irmão
A amizade de irmão com o filho de Guia Lopes.
Aqui começa um outro capítulo da história feita por José Bião Neto. Ele e José Francisco Lopes ( o filho do
herói) se conheceram ainda no então Acampamento do Rio Miranda, em 1937. A amizade
nasceu de uma forma comum, ou seja, José Francisco tinha uma fazendinha na
vizinhança, onde todos procuravam buscar ali, laranja, limão e outros produtos,
e um dia Bião conheceu seu maior amigo, conforme afirmou: “fomos compadres duas
vezes. Meu amigo íntimo, muito querido mesmo”.
Através da amizade,
Bião sempre esteve presente, com sua história, nos momentos mais difíceis da
vida do filho do herói, nascido na fazenda Apa[3],
cabeceira do rio Apa no dia 12 de dezembro de 1864. Foi naquela Fazenda onde
tudo começou a piorar para José Francisco, quando em 1864, a Fazenda foi
invadida por forças do ditador Francisco Solano Lopes. Com menos de um ano de idade, sua mãe
Senhorinha Maria Conceição Barbosa de Lopes, seu pai, José Párvulo Francisco
Lopes e mais seis irmãos tiveram que fugir[4].
No mesmo ano, em meio a
um laranjal nativo, fundaram a nova posse, as margens do Rio Miranda, criando
ali a Histórica Fazenda Jardim. Alia paz durou muito pouco, porque em Janeiro
de 1865 a Fazenda Jardim foi invadida por forças paraguaias. Dona Senhorinha[5] e
seus filhos foram presos, levados para o campo de concentração de Vila
Horcheta, na República do Paraguai, onde foi escravizada por cinco anos. No dia
1º de março de 1870 ela foi libertada juntamente com os filhos, mas já não
voltou para a Fazenda Jardim, terminando de criar os filhos na Fazenda Itá,
também as margens do Miranda.
Senhorinha ficou pobre
com os filhos e numa tentativa desesperada, tentou reaver a posse da Fazenda
Apa em abril de 1879, dirigindo extensa petição aos políticos da época, porém
até a sua morte nada recebeu, perdendo os documentos originais da propriedade,
que desapareceram do domicílio da família de Guia Lopes. O amigo de Bião, (José Francisco Lopes) também ficou
pobre, inclusive não aceitaram que fossem aceitos como doação os 30 hectares doados por ele para a fundação da cidade de
Guia Lopes da Laguna. Como uma ação
entre amigos, todos que participaram da criação da cidade, resolveram dividir
em lotes a doação e entrega-los a José Francisco, para que com isso ele pudesse
sobreviver”.
[1] A
grafia correta é Nywton. N.E.
[2] A
grafia correta é Pery. N.E.
[3] O
correto é José Francisco Lopes Nasceu na Fazenda Jardim, atualmente no
município de Guia Lopes da Laguna, às margens da Rodovia que liga ao município
e cidade de Bonito. N.E.
[4]
Segundo minhas pesquisas, dona Senhorinha e todos os familiares foram feitos
prisioneiros de guerra dos paraguaios em meados
de 1865 e levados para a Vila de Horqueta. O Guia Lopes, José Francisco
Lopes estava ausente da Fazenda Jardim, encontrava-se em Miranda realizando
negócios de gado. N.E.
[5]
Para o leitor que desejar conhecer melhor a História sugiro a leitura do meu
livro “Guia Lopes da Laguna, Nossa Terra, Nossa Gente, Nossa História. José
Vicente Dalmolin.
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