PARTE 1
José
Vicente Dalmolin
Guia Lopes da Laguna
80 anos da Fundação da Cidade
(A última filha caçulinha do município de Nioaque)
19 de Março de 1938 – 19 de março 2018
A fundação da
Cidade de Guia Lopes da Laguna e mais tarde tornando-se município, desmembrado
de Nioaque, teve dois momentos históricos,
solenes e festivos:
12 de fevereiro de 1938, Ato
Oficial com registro de fundação em local de residência de José Francisco
Lopes, o penúltimo filho do Guia Lopes (também chamava-se josé Francisco
Lopes).
19 de março de 1938, Ato Religioso e festivo,
local nas proximidades da atual praça, frente a Igreja de São José.
Em 1938 foi
fundado simplesmente como “Patrimônio
Guia Lopes”
A partir de 1942,
por lei e definição do IBGE, foi incorporado o nome “Laguna”, para diferenciar
da cidade de Guia Lopes, em Minas Gerais e do ponto da Estação Ferroviária Guia Lopes, nas proximidades de
Aquidauana. Oficializando assim a denominação de “Guia Lopes da Laguna”.
Bibliografia
básica:
Guia Lopes da
Laguna, Nossa História, Nossa Terra, Nossa Gente. José Vicente Dalmolin. 2012.
Obra digitalizada.
No Transpirar da
Vida. Odilon Queiróz. 2006. Obra digitalizada.
Diário Histórico
de Guia Lopes da Laguna. 2012. Bião Netto. Obra Digitalizada.
Um breve resumo
destes dois momentos em dois artigos.
1. Antes uma breve
contextualização
Da Construção da
Ponte sobre o Rio Miranda a fundação da Cidade de Guia Lopes da Laguna
Nos anos de 1930 o
Exercito Brasileiro coordenou e executou diversos serviços por todos os pontos
do Estado de Mato Grosso. Trabalhos que foram desde abertura e melhoria de
estradas rodoviárias, construção de pontes, campos de pouso para aviação, além
da integração e contribuição para a segurança e conter movimentos armados.
Uma deste conjunto
de obras, onde teve a participação fundamental das unidades militares
aquarteladas no sul de Mato Grosso, destaca o Batalhão de Engenharia que tinha
sua sede fixa na cidade de Aquidauana, foi o da integração entre as cidades de
Aquidauana – Nioac – Bela Vista e Porto Murtinho. Guia Lopes da Laguna e Jardim
não existiam
A Margem direita
do Rio Miranda (hoje Guia Lopes, pertencia ao Município de Nioac)
A Margem esquerda
do Rio Miranda (hoje Jardim, pertencia ao Município de Bela Vista)
Em
1934 o Batalhão se deslocara de Nioaque para a Fazenda Jardim, em vista da
ordem do Comandante da Região Gal. Newton Cavalcante, e como tal, foi chegando
à mudança e atirada à margem esquerda do Miranda sem a devida escolha do local
do acampamento, porque, nem sequer, por sinal, existia uma barraca armada ou
qualquer vestígio de início de instalação de acampamento, porque tempo não
houve para tais providências.
A passagem pelo
passo velho da fazenda Jardim estava péssima, e com o tráfego constante das
nossas viaturas, dia-a-dia piorava. Tornou-se mais viável pelo local onde ia
ser construída a ponte. De início era assim: esticou-se um cabo de aço de
margem a margem com duas roldanas, nas quais, pendurado um caixão que, puxado
para um lado e para outro, transportava tudo: material, gêneros, forragem e
pessoal.
Segundo
depoimento de José Bião Neto, publicado na Revista Executivo Plus1, 1986,
“Como militar chegou em Aquidauana, para servir no 4º Batalhão de
Sapadores. Sapadores era uma unidade militar,
encarregada de tudo aquilo relacionado com movimento de terra, por
exemplo, trincheiras, poços de água, pontes, etc. Isso foi em 1935, mais dois anos depois,
Bião Neto foi transferido para a 1ª Companhia do Batalhão de Sapadores,
sediada no então chamado Acampamento do Rio Miranda (hoje Guia Lopes).
Passarela sobre o
rio Miranda. Confluência entre o rio Santo Antônio e o Miranda.
Apesar
do Btl. estar mais com as suas atividades opostas à direção da Fazenda Jardim,
construiu, porém, aí, a ponte de concreto armado sobre o rio Miranda. É uma
bonita obra de arte com a sua estrutura em forma de arco. A Firma empreiteira
Tomé & Irmão, foi quem a construiu.
Os
fiscais desta obra de arte foram os seguintes: Tenente Theodorico de Faria,
Tenente Clodoaldo de Oliveira Basto e Capitão Reinaldo Pessoa Sobral. Este
último oficial era também o Comandante da 1a Cia, cujo acampamento
ficava à margem direita do rio Miranda.
Os
trabalhos de mais urgência da Cia estavam sendo os de construção de cortes e
aterros adjacentes à referida ponte. Esse trabalho era feito por tarefa.
Escavação manual – 5,3m em média para cada homem – e o transporte do material
escavado, em caminhão concluía o jornal do dia, nessa base, para a turma
empregada nesse mister.
Fizemos,
portanto à véspera do Ano Novo de 1938, alegres com a mesma fé que fala bem
alto em nossos corações, em nossas almas que constitui a singular humanidade –
a sua razão de ser uma coisa demais sublimada – divinal – como esplendoroso
reflexo da luz do santo amor de Deus.
O
tempo estava chuvoso. Água do céu caia incessantemente o dia inteiro e
continuou pela noite adentro. Os nossos ranchos-de palha sempre demais eriçada
ao calor do sol, como galinhas arrepiadas, em virtude das chuvas, não se
apresentavam assim; tinham as folhas assentadas com o peso da umidade de forte
inverno, a pingar.
Reunimo-nos
todos do acampamento: sargentos, cabos soldados, civis, nossas famílias e
alguns vizinhos com o Sr. José Francisco Lopes, filho do célebre “Guia Lopes”
da história da Retirada da Laguna, e família, que foram uns dos nossos
convidados...
Este
ancião José Francisco Lopes Filho, não poderia deixar de tomar parte em nossas
festas, Além de ser filho do extraordinário “Guia Lopes”, ocupávamos nós, bons
hectares de terras com o acampamento da 1a Cia de Sapadores ali
instalada há muito tempo, cedidos por
ele com grande prazer.
Como
fortes paladinos da propaganda da fundação de um Patrimônio (termo que se empregava para a
fundação de um povoado, vila, cidade)
que se falava – do patrimônio que não se sabia ainda como poderia ser,
como deveria ser e quando deveria aparecer esse bicho vagamente sonhado, sem
meios, sem recursos e sem nada, estavam os sargentos: Bulhões, Fioravante e
Odilon, metidos a resolver uma cousa difícil, que ainda hoje fico a pensar,
como conseguimos tal proeza, de vez que, outra cousa não fazíamos, senão
conversarmos daquele jeito somente no boteco do gringo Jaime Artigas.
Impressionado
então como poderia ser realizado o nosso sonho, ficava eu a pensar, e, sem
outro objetivo, a idealizar as suas formas. Finalmente, conhecendo eu um pouco
do traçado de quadras, lotes, praças da urbanização de Aquidauana, primeiro
peguei uma carteira vazia de cigarro “Ascot” e nela desenhei uma quadra
dividida em lotes e daí, numa folha de papel almaço sem pauta, fiz então, tosca
planta do sonhado burgo e de acordo com Fioravante e Bulhões, ficou
estabelecido aquele traçado para o começo do patrimônio.
Considerando
que o acampamento estava em terras das propriedade do Senhor Lopes, a fundação
de um Patrimônio precisaria de uma área de terra.
Chavasco
era o homem indicado para abordar o Sr. José Francisco Lopes Filho com as suas
maneiras e conversas de bom diplomata; ao seu lado estaria Fioravante, por ser
artista para conseguir as cousas; Bulhões, se manteria em guarda com a sua
folga de simplicidade que estava o povo sertanejo
Encontrava-se
o velho Lopes do lado de fora sob a biqueira da casa, na parte sombria ao cair
da tarde, sentado num banco rústico, (um pedaço de costaneira de pé cambaios),
O qual demonstrava ter sido feito há muitos anos, quem sabe, por seu pai?
Estava liso e até brilhante como se envernizado, de tanto se sentarem nele.
Fumava um cigarro de palha um tanto grosso e algumas baforadas de fumaça
divulgamos de longe. Esta sua pobre moradia de quatro águas, de taipa,
cobertura já velha de capim- sapé tinha a cor de terra que era vermelha, e o
esqueleto da armação das paredes: pé-direito e varais estavam à mostra, por ter
o bruto reboque caído com o lavar das chuvas de vários invernos. A casa dava os
fundos para o S. Antônio que bem perto passa.
Não
tínhamos pressa de puxar o assunto da razão especial da nossa visita. Os
minutos iam passando sem demonstrarmos preocupação alguma.
De
sorte que, o que tínhamos a tratar, partiu naturalmente – do próprio velho
Lopes – que de certo, por ouvir falar tanto, já estava desejoso pela realidade
do patrimônio falado em suas terras.
Moderadamente,
Chavasco mostra-lhe a improvisada planta do Patrimonio (cidade), contando-lhe
tudo; que o patrimônio terá o nome de “Guia Lopes” em homenagem ao seu pai; que
o padroeiro da igreja, será São José, por ele se chamar José, bem como seu pai;
que as principais ruas terão o nome de: Coronel Carlos de Morais Camisão,
Coronel Pedro Rufino, Coronel Porto Carreiro, Capitão Pisaflores... conforme já
figurava na planta.
Pois
bem meus amigos; vamos fazer o seguinte: Darei de princípio, 20 hectares de
terras, compreendidos entre o grotão e a
divisa com as terras Fábio Martins, está bem? – Ficam satisfeitos? Então está
dito. Eu e a minha mulher e os filhos, já conversamos muito a respeito desse
patrimônio. Todos acham bom e estão plenamente de acordo.
O
terreno doado pelo Sr. José Francisco Lopes, limita-se a Leste com uma pequena
bacia que vai se estreitando para o Sul, de acordo com as condições
topográficas do solo, formando assim o Grotão, para o escoamento das águas da
referida bacia, pelo inverno; a Oeste, com os terrenos do Sr. Fábio Martins
Barbosa; ao Sul com o rio S. Antônio e ao Norte, até onde se projeta o seu
limite.
A
Escritura de Doação:
CERTIDÃO
“CERTIFICO, que a pedido de parte interessada revendo nos
arquivos de meu cartório no livro nº 03, as fls 44/45, no ano de 1938 a 1940,
consta o seguinte documento:
Escritura Publica de doação que fazem José
Francisco Lopes e sua mulher Dona Maria Rufina Lopes, como doadores e a Prefeitura Municipal de
Nioaque, como donatária, na forma abaixo:
Saibam quanto esta escritura publica de
compra e venda digo de doação virem que no ano de mil novecentos e trinta e
nove, aos cinco dias do mês de Julho do dito ano, nesta cidade de Nioaque,
,termo de igual nome, Comarca de Aquidauana, Estado de Mato Grosso, em meu
Cartório compareceram, perante mim tabelião, partes entre si justas e
contratadas a receber: de um alado como outorgantes doadores José Francisco
Lopes e sua mulher Dona Maria Rufino Lopes, brasileiros, maiores,
proprietários, residentes neste município, estando a doadora Maria Rufina
Lopes, representada neste ato, por seu marido e procurador o outorgante doador
José Francisco Lopes; e como outorgada donatária a “Prefeitura Municipal de
Nioaque”, representada legalmente por seu Prefeito Municipal, o Cidadão Antonio
de Oliveira Flores, todos meus conhecidos pelos próprios de que trato e dou fé, e as duas testemunhas
adiante nomeadas e assinadas, perante as quais pelo outorgante doador me foi dito, que sendo
legítimos possuidores de uma parte de terras situadas na “Fazenda Jardim”,
deste Município, no lugar denominado “Guia Lopes”, medindo a área de 20
hectares, limitando-se: ao poente, com a
linha divisória com as terras de Fábio Martins Barbosa; ao sul com o rio Santo
Antonio; ao nascente pelo Grotão e ao poente, digo norte com terras dos
doadores; terreno este que se acha livre e desembaraçado de quaisquer ônus ou
hipotecas, inclusive legais e que adquiriram por herança e que se acha
registrada sob n.º de ordem 360, do livro n.º 3 desta ex-Comarca, pela presente
escritura, de suas livres e espontâneas vontades doam, como efetivamente doado
tem, o terreno acima descrito, à outorgada donatária Prefeitura Municipal de
Nioaque, para o fim especial de ser utilizada pela servidão publica e sob a
fiscalização da donatária. Pela outorgada, por seu representante legal, me
foi dito que aceitava esta escritura de doação, em todos os seus termos, por
estar de inteiro acordo com o ajustado e contratado entre si e os
doadores. A pedido das partes lavrei
esta escritura a qual lhe sendo lida e
perante as mesmas testemunhas, aceitaram
outorgada e assinam, com as testemunhas cidadãos Carlos Dobes e Synesio
Chavasco, maiores, capazes, residentes nesta cidade, conhecidas de mim tabelião
pelas próprias de que trato e dou fé, que a escrevi e assino em público e
raso.
Em
Testº (estava o sinal publico da verdade).
Dado e passado aos dez dias do mês
de Dezembro de mil novecentos e setenta e nove, nesta cidade e distrito de
Nioaque, Comarca de Aquidauana, Estado de Mato Grosso do Sul, que por ora me
reporto e dou fé. Eu Rui Alves de Lima,
Tabelião que mandei datilografar subscrevi e assino.
(Extraído
da transcrição original, fornecida pelo Cartório de Nioaque).
Tempos
mais tarde, o Sr Fabio Martins Barbosa, lindeiro de Lopes e do Patrimônio,
também fez uma doação de uma área de 25 hectares que foi anexado para a
fundação da cidade.
CERTIDÃO
CERTIFICO, que a pedido de parte interessada que revendo nos
arquivos de meu cartório no livro n.º 3, as folhas 51/52, ano de 1938 a 1940
consta o seguinte documento:
Escritura Publica
de doação que fazem e assinam Fábio Martins Barbosa e sua mulher com a
Prefeitura Municipal de Nioaque, como abaixo se declara:
Saibam quanto esta escritura pública de
doação entre vivos, virem que, ano de
mil novecentos e trinta e nove, aos trinta dias do mês de Agosto do dito ano,
na Fazenda do Senhor Fábio Martins Barbosa, onde eu tabelião ai me achava, sito
neste município de Bela Vista, neste Estado de mato Grosso, perante partes
entre si e justas contratadas a saber de um lado, como outorgantes doadores o
cidadão Fábio Martins Barbosa e sua
mulher Deolinda Barbosa Martins, residentes no Município de Bela Vista,
casados, fazendeiros, e como outorgada donatária Prefeitura Municipal, o
cidadão Antônio de Oliveira Flores, todos
meus conhecidos, pela própria de que trato e dou fé, e as duas
testemunhas adiante nomeadas e assinadas, perante as quais pelos outorgantes
doadores me foi dito que sendo legítimos possuidores de uma parte de terras
pastais e lavradias, situada na fazenda Jardim, no Município de Bela Vista,
digo no Município de Nioaque, neste estado, no lugar denominado Guia Lopes,
compreendida dentro dos seguintes limites:
ao Norte, pelo lado esquerdo do aterro e corte da estrada e automóvel
que vai de Aquidauana à Bela Vista, desde a ponte sobre o rio Miranda até o
aramado que divide as terras dos doadores, com as terras doadas a Prefeitura
Municipal de Nioaque, pelo Sr. José Francisco Lopes e sua mulher; ao nascente
pelo dito aramado, em rumo ao sul, até alcançar o rio “Santo Antônio”,
limitando-se em toda esta linha com a referida terra doada a outorgada
Prefeitura Municipal de Nioaque, ao sul, pelo rio “Santo Antonio” abaixo da
barra da cerca de arame até a sua foz no rio Miranda; e abaixo até a ponte da
referida estrada de automóvel de
Aquidauana à Bela Vista, fechando desta forma o perímetro de terras doadas por
força desta escritura. Doação esta os
outorgantes fazem a Prefeitura Municipal de Nioaque, para o fim de aumentar o
terreno destinado ao povoado denominado Guia Lopes, para o fim especial de ser
utilizada pela servidão pública sendo a bem e ao rumo digo progresso do
referido povoado e sob a fiscalização da donatária. Pela outorgada representada pelo seu Prefeito
Municipal cidadão Antonio de Oliveira Flores, me foi dito, em presença das
mesmas testemunhas que aceitavam esta escritura de doação, em todos os seus
termos, por estar de inteiro acordo com o ajustado e contratado entre si e os
doadores. E a pedido das partes, lavrei
esta escritura de doação, a qual lhes sendo lida, perante as mesmas testemunhas
que são os cidadão Braz Réa e Roldão Ferreira de Lima, brasileiros, maiores,
casados, comerciantes, residentes no Município de Nioaque e meus conhecidos do
que trato e dou fé. Eu Sebastião David
Medeiros, tabelião que a escrevi e assino em publico e raso.
Em Testº (estava o sinal publico da verdade)
Dado
e passado aos dez dias do mês de dezembro de mil novecentos e setenta e nove,
nesta cidade e de Nioaque, Comarca de Aquidauana, esta de Mato Grosso do Sul,
que por ora me reporto e dou fé. Eu Rui
Alves de Lima, tabelião que mandei datilografar, subscrevi e assino.
(Extraído
da transcrição original fornecida pelo
Cartório de Registro da cidade de Nioaque)
Diante
do arrojado prenúncio da realidade do patrimônio, o Sr. Fábio Martins Barbosa,
não obstante nos tratar sempre bem, não deixou de desconsiderar o nosso apelo,
quando por mais de uma vez em sua casa o procuramos, solicitando-lhe sua ajuda
aos nossos ideais, pois, queríamos e precisávamos contar com ele, com seu
apoio, como companheiro.
Como
abastado fazendeiro pertencente a grande família Barbosa, distinta e de valor
como é, e, também, pertencente a família do famoso “Guia Lopes”, porque era
casado com uma neta deste grande herói, D. Deolinda, por tudo isso, ninguém
pode contestar dos nossos esforços, do grande empenho que fizemos para
atraí-lo, e convencê-lo.
Pretensão – fundar
um patrimônio em suas terras ou próximo – e assim, como pequeninos lhe pareciam
os três Sgts: Fioravante, Bulhões e Odilon.
Em
virtude dos nobres gestos e atitude do Sr. Francisco José Lopes Filho em doar
20 ha. Para a fundação do patrimônio, eis que o Sr. Fábio Martins Barbosa
aprontou:
Sem
falar conosco cousa alguma, não sei por que carga d’água deu na cabeça dele de
fazer uma revolução da noite para o dia, na calada, com referência ao
patrimônio, e tratou de uma forte campanha, tornando-se desta maneira o chefe
absoluto – o ditador a moda sertaneja, da história. E assim, não poderia deixar
de mandar mensageiros por todo o lado, para as bandas de Patrimônio Bonito,
Murtinho, Dourados, Margarida e até lá para a região de Vacaria em cima da
serra e por toda a parte, convidando amigos e parentes a uma reunião na Fazenda
Jardim no dia 12 de fevereiro de 1938, a respeito da fundação de um patrimônio,
que não sei se teria o mesmo nome de Guia Lopes”
Ten.
José França que estava respondendo pelo comando da Companhia, e os Tenentes:
Darcílio Leal de Menezes e Afonso de Menezes Dipp que se encontravam no
acampamento, ficaram admirados de ver tanta gente.
O
Sr. Fábio Martins Barbosa, acompanhado de respeitáveis amigos, sem dúvida
nenhuma, fazendeiros e parentes seus, estranhos para nós, se dirigiu ao P.C.
(posto de comando) onde se encontrava os oficiais. Fábio Martins foi recebido
com a devida consideração, bem como seus amigos, pelo Ten. José França e os
dois colegas: Darci e Dipp. Ali se demoraram conversando cerca de 15 minutos. Não
poderia deixar de convidá-los para tomarem parte na festa, porquanto,
tratava-se da fundação de um patrimônio. Chavasco que se encontrava palestrando
com os oficiais, foi também convidado. Não poderiam deixar de aceitar tão
honroso convite, e, assim, Fábio Martins saiu de lá todo contente e orgulhoso.
2.O ato Oficial de
Fundação, Dia 12 de Fevereiro de 1938
Eram
seguramente 12 horas. Muita gente já se encontrava reunida no local da festa.
Não sei de onde saiu tanto povo. Estava em cima da hora. Os oficiais se dirigem
para lá. Em face da ordem do Cmt. da Cia. Tenente França, nós acompanhamo-lo.
Com a chegada dos oficiais, o povo ainda mais se aglomerou. Logo depois, não
sei se apedido do Sr. Fábio Martins ou por sua espontaneidade, o Tenente França
fez uso da palavra trepado na cabeça de um toco de uma árvore cortada, para
assim se ouvir melhor.
Com
um timbre de voz vibrante, ecoante, de maneira surpreendente e sugestiva,
falava ao povo como um bom orador. Suas palavras calorosas e emocionantes –
partindo do coração, transformaram aquela simples reunião promovida pelo Fábio
que, por certo, ninguém compreenderia o seu sentido, o seu valor, num
improvisado altar da Pátria em plena campanha. Todos ali presentes, passaram a
ver e a sentir na despertada imaginação a través da crença, da fé que se
avolumava, que se renovava em cada um, a bonita imagem de um Brasil moço,
forte, rico e poderoso, talhado pelas nossas mãos – como brasileiro que somos –
pelos nossos ideais sublimes e edificantes; de um Brasil de ideias novas,
construtivas e salutares; de um Brasil culto, inteligente, civilizado,
progressista e varonil que, _ muito bem simboliza o Pálio sagrado, tal e qual,
o incalculável valor de nossas riquezas cada vez mais vicejantes. Assim, esta
imagem sacrossanta da Pátria querida, muito altaneira, tremula feliz, ao sopro
de menor brisa a beijar-lhe carinhosamente, confiante, muito confiante mesmo,
nos seus amados filhos, garantida por seus filhos que somos nós.
As
suas palavras não foram pregadas no deserto. Tiveram talento e fé. Os seus
efeitos foram prodigiosos.
Versou
sobre a epopeia da “Retirada da Laguna”, cujos heróis que ali mesmo tombaram
não vencidos em 1867, enobrecendo de maneira admirável a grandeza e o valor da
Pátria estremecida, expôs à estima e à carícia do nosso afeto por ela.
Ressaltou o nome do velho sertanejo José Francisco Lopes, o “Guia” Lopes, que
deixou de lado a terra em que pisamos – a grande e histórica Fazenda Jardim –
que era sua, entregando tudo a Pátria – o seu gado, a sua propriedade e a
própria vida – num resgate amargo, muito caro, de profunda dor e de extremo
sacrifício, como protesto as crueldades e brutais violências praticadas pelos
soldados do ditador do Paraguai Francisco Solano Lopes, invasores audazes do
solo pátrio. Foi assim que fizeram os nossos antepassados – valentes ancestrais
estes – que não se incomodaram de perder a vida, para em troca, nos legar,
assegurar esse mundo de incomparáveis riquezas que
hoje desfrutamos folgadamente com a liberdade que nos confere o direito, como
sempre, de donos que somos. Nos pertence este Brasil imenso e abençoado por
Deus. E, por sinal de Sua graça, vemos no céu, bem alto, o invejável “Cruzeiro
do Sul” que consideramos nosso também, muito cintilante e de forma preciosa e
viva, como a pureza de nossa fé, a guiar-nos aos impulsos de delicado e
compreensivo amor que nos leva a Divindade; simbolizando naturalmente assim na
expressão máxima da cristandade, as coisas dos céus – o nosso grande amor que
se reflete através dos bons sentimentos humanos – à beleza de iluminada razão
na prática dos direitos humanos e da justiça – que vai nos guiando às coisas
sublimes da Vida Eterna. Esta nossa herança, é uma das maiores riquezas do
mundo, e, finalmente, a mais bela, a mais sagrada. Devemos, pois, conserva-la,
cuidá-la com todo desvelo, com toda a força do que é capaz o nosso amor, para
que ela se torne mais encantadora, mais forte, mais digna, mais rica e
poderosa.
A
elegância do Tenente José França, naquele momento, dominado por elevados sentimentos
patrióticos, creio, que fez admirar a si próprio.
Descambado
para os bons acontecimentos daquele dia, apontou para o 2o Sgt.
Odilon de Queiroz, 3o Sgts: José Antônio de Bulhões e Luiz
Fioravante fez sentir a todos os presentes, que eram eles os principais
responsáveis pela criação do patrimônio que ora se anunciava, visto que,
notando eles essa campanha completamente despovoada, por grande amor ao nosso
Brasil, vem há muito tempo concitando o povo bom amigo da região, a todos,
enfim, para juntos, fundarem esse patrimônio aqui nas terras da Fazenda Jardim.
Foi
por isso que o Sr. José Francisco Lopes Filho doou 20 ha. para os devidos fins,
e que terá o nome de Guia Lopes da Laguna, em homenagem ao grande herói
brasileiro. É justamente por isso também, que o Sr. Fábio Martins Barbosa
promove esta soberba festa, oferecendo assim, farto e apetitoso churrasco a
todos. E muito feliz como encontro-me por dirigir-vos a palavra povo dessa
fronteira querida, cabe-me o dever de elevar com alto apreço, o nome deste
ilustre cidadão Sr. Fábio Martins Barbosa, pelo seu grande entusiasmo pelas
coisas que elevam a nossa Pátria, abreviando desta forma tão providencial, com
este seu gesto tão nobre, com essa sua valiosa ajuda, o nascer do enunciado
patrimônio, onde, verdadeiros espíritos de brasilidade se comungam numa sadia
manifestação soberba, bonita, pelo progresso do nosso querido Brasil.
Portanto
meus senhores e minhas senhoras, confesso ainda, que me sinto orgulhoso por
comandar sargentos, como, Odilon de Queiroz, José António de Bulhões e Luiz
Fioravante, meus valentes companheiros de jornada no desbravamento dos sertões,
forçando assim, risonho futuro de nossa querida pátria através de tantos
sacrifícios, na dura luta de seu porvir todo cheio de grandeza e de felicidade,
conforme palpitam em nossos corações ansiosos nessa grande luta.
São,
pois, eles, os principais responsáveis pela criação do patrimônio, que vem a se
chamar Guia Lopes. Cabe a eles, o simples direito, portanto, de assinarem
primeiro no caderno em branco que se encontra nessa mesa aí posta, para receber
as assinaturas de todos os presentes, de todos que tomam parte nessa importante
reunião que, verdadeiramente, é uma festa de grande significado para a nação,
porque, somente se reflete em elevados espíritos dotado de bonitos sentimentos
patrióticos. E com “Viva o Brasil!” – conclui a sua impressionante oração.
Entre
outros, assinaram o caderno de registro:
Sgt.
Odilon de Queiroz,
Sgt.
José Antonio de Bulhões,
Sgt.
Luiz Fioravante
Ten.
José França,
Ten.
Darcílio Leal de Menezes,
Ten.
Afonso de Menezes Dipp,
Sinésio
Chavasco,
Basílio
Barbosa,
Fábio
Martins Barbosa,
Osvaldo
Monteiro,
Macário
Aristimunha,
Cabo
Antônio Celestino de Queiroz,
Jaime
Artigas,
Cabo
José Macedo,
Sd.
Severino Felix da Silva
José
Francisco Lopes
E todos os demais
presentes...
No verso da fotografia continha os seguintes
dizeres: “Em 12 de fevereiro de 1938 Photografia da 1ª reunião para a fundação
do Patrimônio Guia Lopes”
Oferta de Fábio
Martins
Ainda
no mesmo dia 12 de fevereiro,
reuniram-se os principais companheiros, e num bom entendimento, ficou
programado o que se tinha a fazer, marcando-se a data da fundação de Guia
Lopes para o dia 19 de março, dia de S.
José, apenas 34 dias após.
Não
deixamos de passar um telegrama para o governador do Estado, participando-lhe
dos bons acontecimentos que promulgavam o fundamento do citado patrimônio”.
“Exmo. Sr. Dr.
Getúlio Vargas,
DD. Presidente da
República, Palácio do Catete, Rio.
Qualidade ultimo
filho sobrevivente velho sertanejo Guia Lopes, grata satisfação comunicar
vossência, doze fevereiro, histórica Fazenda Jardim, minha propriedade,
realizou-se grande reunião, fazendeiros, pessoas gradas, exmas. Famílias,
municípios Bela Vista, Bonito e Nioaque, fim fundação Patrimônio Guia Lopes
homenagem memória saudoso pai, tombou
mesmo local, defesa integridade Pátria.
Gesto nobre, patriótico, sob
auspícios briosa oficialidade,dignos sargentos 1º Cia. 4.ª B.S. há muito
acantonado estas paragens, obteve
grandes aplausos população por vir plantar rica vastíssima zona, exemplo
verdadeiro civismo e sentimento patriotismo gerações vindouras. Reunião foi presidida digno comandante
companhia, qual expôs fim mesma, dissertando feitos heróicos componentes
Retirada da Laguna, quais tombaram vitimadas cólera, justamente solo onde se
fundou Patrimônio. Dr. Sinézio Chavasco,
fazendeiro palavra, congratulou-se ato
patriotismo, relembrou feitos gloriosos Exército Nacional, dissertando atual regime sob benéfica orientação
vossências. Foi dado conhecimento Dr.
Interventor Federal, remetendo Ata dia 12 de fevereiro. Pedindo Vênia vossência solicito nome povo
patrimônio apelando sentimento patriotismo eminente chefe, possível fundação
pequena escola federal, prática agricultura e pecuária, ramo nosso grandioso
Estado, qual trará imenso resultado benéfico região onde tudo é feito sistema
rotineiro. Sede Patrimônio, localizada
belíssima campanha, sob ponte rio Miranda, margem rodovia construída glorioso
4.º B.S. pouca distância campo Santo onde repousam restos mortais heróis
Retirada da Laguna a poucos passos tapera onde viveu inesquecível Guia
Lopes. Certo Vossências atendendo apelo
prestando essa homenagem, velho
sertanejo, imenso prazer dizer-vos que com 76 anos último filho sobrevivente
Guia Lopes, morrerá satisfeito benefício mocidade vindoura, abençoado nome
nosso Interventor Federal e Ilustre Presidente.
Respeitosas
Saudações
José
Francisco Lopes”
1.
Ato Religioso da
Fundação, dia 19 de março de 1938
Próximo
artigo
Construção de uma igrejinha.
Construção de um rancho para
escola.
Construção de um poço
público.
Compra de material.
As Festividades.
Continua...
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